De forma simplista: ganha o direito de retenção. Contudo, a 24 de agosto de 2024 vai ser implementada uma alteração significativa a este regime.
O direito de retenção previsto no Código Civil é, sucintamente, o direito a não restituir uma coisa, enquanto o credor dessa restituição não cumprir, por seu turno, a obrigação que tem para com o retentor. Um exemplo paradigmático do direito de retenção é aquele exercido pelo mecânico que, após ter realizado as devidas reparações e não lhe ter sido pago a contraprestação respetiva, não entrega o veículo (ou seja, "retêm a coisa").
Este direito é uma das poucas exceções à hipoteca (o direito de ser pago pelo valor de certas coisas imóveis, ou equiparadas), que na maioria dos cenários se apresenta como sendo a garantia de crédito privilegiada. Por outras palavras, na maior parte das vezes, mesmo que seja constituído um crédito (por exemplo, pessoa X contrai uma dívida a 02/02/2022) e mais tarde seja constituída uma hipoteca (imagine-se, a 04/04/2024) é o crédito que a hipoteca visa assegurar que prevalece sobre aqueloutro crédito (daí que muitos bancos constituam hipotecas para garantia dos seus empréstimos).
Sem prejuízo, uma exceção à regra é o direito de retenção, previsto e preceituado no art. 754º do Código Civil: "goza do direito de retenção se, estando obrigado a entregar certa coisa, o seu crédito resultar de despesas feitas por causa dela ou de danos por ela causados.". Do que se pode ler, fica evidente que o único critério para aquele prevalecer é que o crédito tenha de resultar de despesas feitas por causa da coisa em questão ou danos por ela causados, independentemente da data em que tenha sido constituído.
Ou seja, um empreiteiro que tivesse feito obras numa casa, tem o direito a não entregá-la enquanto o crédito não fosse cumprido; e inclusive sobrepõe-se a qualquer hipoteca, anteriormente ou posteriormente constituída!
Porém, com o Decreto-Lei n.º 48/2024, de 25 de julho, limita-se as situações em que o direito de retenção prevalece sobre a hipoteca, passando-se a condicionar a prevalência do direito de retenção sobre a hipoteca anteriormente registada à circunstância de o crédito garantido assegurar o reembolso de despesas feitas com o imóvel que tenham contribuído para o conservar ou para aumentar o respetivo valor.
Neste caso, o empreiteiro que fez as obras continuaria a ter direito de retenção que, evidentemente, prevaleceria sobre a hipoteca. Contudo, se o meu direito de retenção se fundamentar na mera aquisição de, por exemplo, janelas, e que a final não foram instaladas, então tecnicamente não contribuiu para conservar ou aumentar o valor do imóvel (porque não foram instaladas) e, por isso, à vista das novas alterações, não tenho o direito a recorrer nestes casos à retenção (e muito menos prevalece sobre as outras garantias).
Esta é uma alteração substancial e beneficia principalmente os bancos e instituições de crédito, cujo modus operandi é recorrer a hipotecas para garantir os seus créditos, e poderá deixar muitos empresários e particulares numa situação mais desvantajosa e frágil. Pelo que alertamos para esta pequena (grande) alteração.
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