Surpreendentemente, a resposta a esta pergunta é "sim". Sim, pode-se perder a casa por causa de uma dívida tão insignificante- pelo menos comparativamente ao valor de um imóvel- de 2.000,00 euros.
Já não é a primeira, nem segunda (e infelizmente, creio que não será a última) vez que aparecem no escritório com uma situação parecida. Famílias, passando dificuldades, fazem um empréstimo de pequena dimensão. Suponhamos 2000 euros. Ora porque precisam de comprar um carro para ir trabalhar e estar à vontade com horários; ora porque têm tido despesas avultadas extraordinárias; ora porque alguém está doente ou desempregado; ora porque há que fazer obras de reparação na casa.
Na sequência deste (pequeno) empréstimo, seguem-se alguns meses mais difíceis. Vai-se pagando as prestações a custo, mas lá se consegue. Eventualmente, e como é habitual na vida de qualquer família portuguesa, existirão uns meses mais difíceis do que o habitual. Então não se paga a prestação de um mês. E depois não se paga a prestação do seguinte. No terceiro paga-se. Mas já está tudo perdido.
É surpreendente mas é verdade: basta imiscuir-se do pagamento de uma prestação (embora as empresas de crédito optem por duas) para que uma empresa de crédito possa prosseguir com uma ação de cobrança contra si, e notificá-lo para se defender ou para pagar (não só o remanescente do crédito que foi emprestado, como ainda acrescido de juros! e despesas de cobrança).
O maior erro da maior parte das famílias carenciadas que chegam a este ponto é recusar-se a recorrer a um advogado. Tal provavelmente acontece não só pela diabolização que este papel tem sofrido na sociedade, mas também porque receiam não conseguir suportar as despesas dos honorários. Aliás, é natural este medo: se mal se consegue dar vazão a uma prestação de menos de 100 euros, dificilmente se conseguirá a uma de 200, 300 ou mais.
Aqui é que surge o maior equívoco da maior parte dos portugueses: todos aqueles que têm dificuldades económicas comprovadas podem recorrer ao denominado "apoio jurídico", no qual o Estado suporta as despesas de honorários de advogados que se inscrevem, voluntariamente, para representar quem precise. Para tal, basta dirigir-se à segurança social e pedir pelo apoio judiciário.
A diferença de um advogado num processo desta envergadura não é meramente residual. A ação de cobrança apenas pode terminar com o pagamento da dívida na íntegra, por acordo ou no seguimento de uma oposição. Tanto o acordo como a oposição apenas podem ser feitos por advogados. E caso não sejam feitos, segue para penhora!
Ora, imaginando-se hipoteticamente que se prossegue com a penhora, também a presença de um advogado é vantajosa (e custeada pelo Estado), pois poderão defender e negociar que bens podem ou não ser penhorados. Não sendo feito nesta altura qualquer oposição ou negociação, a penhora prossegue, tal como um comboio de alta velocidade, não se podendo voltar atrás.
Por isso, se se vir numa situação de eventual incumprimento, contacte diretamente a instituição de crédito, já que ao abrigo do Decreto-lei n.º 227/2012 de 25 de outubro, a instituição é obrigada a avaliar o seu risco de incumprimento.
Se por acaso se vir numa situação já mais avançada e for notificado de ação de cobrança, ou até já da penhora concretamente, não tente negociar por si mesmo: contacte um advogado. Porque efetivamente, pode perder a sua casa.
Comentários
Postar um comentário